Tuesday, March 01, 2005

11º Capítulo

Gelado
Contido
Agastado
Desprovido de emoção
Basicamente
Clinicamente
Morto.

Assim sou eu
Quero ser eu
Gelado
Contido
Já fui
Era bom
Era forte
Não arriscava.

Mas o gelo quebrou
A alma abriu-se
Mas
Basicamente
Clinicamente
Morto.

Porquê?
A carapaça abriu-se
A máscara caiu
Mas
Basicamente
Se estou vivo de aparência
Estou morto
Deixei de lutar
Ou melhor
Tento esbracejar
Chorar
Pedir
Chamar
Mas
Depois de sofrer
Apesar de sofrer ainda
Apenas me tornei
Num zombie
Porque sobrevivo
Não vivo
Tu não deixas
Não puxas
Não queres
Não sei
O mundo é cinzento
Sou setenta e cinco quilos de matéria amorfa
Desprovida de vida
Flutuo na vida.
Acusem-me de irresponsável
Acusem-me de mimado
Ma sei o que podia fazer voltar
À vida
Está ali
Perto
Tão longe
Tão longe

Desisti
Do mundo
Do amor
Da vida
Da ambição.

Quero-te a ti
Só a ti
Como disse o outro
Tu és a lua
Tu és o sol
Tu és a chama
Tu és o calor
Tu és a vida
Tu és
Sobretudo a morte.

Mas só quero que
Sejas a lua
Eu o sol
Sejas a chama
Eu o calor
Sejas o farol
Eu o barco perdido
Sejas a vida
Eu o sangue
Sejas o vinho
Eu o gurozan.

É assim a vida
Não é
O sonho
Não é a felicidade
Não sei se sofro
Pois penso que
Para se sofrer
É preciso felicidade
Ainda que momentânea
Eu
O fantasma
Apenas estou amorfo
Pois não me posso queixar
Que a minha vida
É
Só tormento
Pois não o tenho
Apenas
Eu o fantasma
Que necessita
De ti
Para a vida
Para a morte
Seja o que for
Estou farto
Da vidinha diário
Da incapacidade de me transcender
Da inconsequência
Da impotência
Sobre a vida
E
Sobretudo
Sobre ti.